Baal, de Volker Schlöndorff
''Quando do seio materno veio Baal,
O céu já era grande
e pálido e calmo,
Jovem, belo e nu;
um monstro-estranho
céu,
Como Baal o amou
quando nasceu.
E o céu em gozo e dor permanecia.
Mas dormia Baal beato, não o via.
Noite violeta, Baal
de porre, bêbado,
De manhã, Baal
sóbrio;
o céu pêssego.''
A tríade não poderia ser melhor composta. Baseado na peça homônima de Bertolt Brecht, desenvolvedor do teatro épico, com atuação
fervorosa de Fassbinder (ator e também diretor de diversas obras-primas),e
direção de um dos ídolos do Novo Cinema Alemão, Volker Schlöndorff.
O longa é sobre o poeta Baal, um anti-herói nato. Sobre suas
muitas mulheres, sobre suas andanças com seu amante, e sobre suas cusparadas na
face do mundo. Tudo bem visceral.
A fotografia de Schlöndorff, com movimentos de câmera
ansiosos e hiperativos. Tudo é movimento, todo o tempo. Nenhum plano fixo. As
imagens dançam. Excentricidade também nos frames embaçados, no começo do filme
e também utilizado outras vezes pelo meio.
O modo como o filme foi dirigido e seu roteiro, se encaixam como nuvem e
céu. Schlöndorff não poderia ter traduzido as palavras de Brecht em imagens de maneira
mais intensa.
Então temos puro teatro, nos sentimos como vislumbrando um
palco, dominado por fervor e agonia. Onde
as atuações espetaculosas desenham um encanto e ao mesmo tempo um desalinho.
Não é um filme de ampla apreciação. A narrativa, nua e crua
nos condena a uma pitada de empatia e também mal estar. Os atos podem nos sufocar, e até mesmo a
poesia. Portanto, há quem escolha ver beleza em tal sufoco, ou apenas não
terminar de assistir. Ou talvez nem começar.
Baal despedaça qualquer tipo de moralidade. Gosta de dançar
sobre as chamas que ele próprio atiça. O que será que há por dentro? Que tipo de demônio é este que o habita, que
o faz cultivar tanta insensibilidade?
Baal trai, Baal humilha, Baal ri enquanto lhe fura a alma, ri
enquanto você mergulha em banheira com gelo. Baal pode lhe causar úlceras, com
sua aspereza cínica. Baal pode lhe dar o céu, e as lindas luzes do Sol, pode
lhe prometer o mundo, pode lhe acariciar o corpo, enquanto sussurra palavras de
amor. Baal pode enfeitar seus olhos, beijar seu ser.
Que explosão em contradição.
Este poeta anti-herói pode ser a resposta da equação do que
a própria sociedade, que deveras vezes é tão negra e opressora, pode criar.
E quem disse que Baal está mesmo contra a maré? Pelo
contrário, talvez ele esteja simplesmente indo com a corrente. A sociedade é um gigante com uma faca,
portanto essa é sua resposta para com ela.
Crueldade distribuída de forma igualitária. Quem poderia culpá-lo?
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